Agenda
Concerto Tragicómico
Até 21 de maio 2022
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17h00
Evento já ocorrido
Local: Quinta da Almiara, Torres Vedras
Raramente uma obra musical estreou em semelhantes circunstâncias: no dia 25 de dezembro de 1781, no Palácio Imperial de Viena, diante dos principais músicos da cidade, do Imperador José II e dois distintos convidados, os Grão-duques Paulo e Maria Romanov (futuros Imperadores da Rússia, que viajavam pela Europa incógnitos), escutou-se, pela primeira vez, uma coletânea de 6 uartetos escritos por Haydn, em 1780, para a casa editorial Artaria. Dadas as ircunstâncias da sua estreia, passariam à posteridade como os Quartetos Russos. A piada que subjaz ao título do quarteto op. 33, n.º 2, surge nos compassos finais do 4º andamento, após impolutas páginas de imbatível graciosidade melódica. O tema do rondo começa a ser entrecortado por silêncios até que, inesperadamente, se extingue! Compostas em 1914, e revistas em 1918, as Três peças para Quarteto de Cordas são um bom exemplo da forma concisa como Stravinsky procura maximizar os recursos. Ao invés do diálogo canónico entre instrumentos, ou da predominância de uma melodia acompanhada, sucedem-se texturas fragmentadas, abundantes em paletas harmónicas e recursos tímbricos. Em 1928, Stravinsky daria um título a cada um dos andamentos: I. Dança; II. Excêntrico; III. Cântico.
Igualmente conciso, mas numa dimensão oposta, o Quarteto op. 95 de Beethoven foi escrito em 1810 e dedicado ao amigo Nikolaus von Zmeskall. Estreado em 1814, e publicado em 1816, tem o curioso facto de partilhar a mesma tonalidade, fá menor, com o primeiro (op. 18) e o último (op. 135) dos seus quarteto de cordas. Beethoven confidenciou “O quarteto é escrito para um círculo de connoisseurs e nunca deverá ser apresentado em público”, o que não é de estranhar dada a tremenda modernidade que o compositor evoca: concentração formal, pungência melódica, robustez rítmica, interrupções abruptas e ousadas mudanças de tonalidade. Talvez daí o título que o próprio escreveu, “Quartett[o] Serioso”. Mas, se a essência emocional é perturbadora, a ansiedade e tensão predominam, fica a nota final do imperativo de transcender as adversidades com os últimos compassos, vertiginosamente primaveris. Como se Beethoven conhecesse os versos de Sophia “Depois da cinza morta destes dias / (…) a terra emergirá pura do mar”.
J. Haydn (1732 – 1809)
Quarteto de cordas em Mib Maior, op. 33 nº 2 “A piada”
I. Stravinski (1882 – 1971)
Três peças para quarteto de cordas
L. van Beethoven (1770 – 1827)
Quarteto de Cordas nº 11, em Fá menor, op. 95 “Serioso”
Atividade Gratuita
"Nesta nova edição da Temporada Darcos, propomo-nos seguir a linha que tem norteado as temporadas anteriores: grande música, grandes intérpretes, mas procurando sempre pontos de contacto entre diferentes tradições, privilegiando o ecletismo e a inclusão. Por isso, desta vez escolhemos o lema da união pela música. Num mundo ainda muito desunido, dividido pelas políticas, pelas religiões, pelas desigualdades e pelos abomináveis racismos, cabe à arte proclamar bem alto que o único futuro sustentável é o da união.
A união pela paz, pelo amor, pelo planeta e pela liberdade. A união dos povos. Nós e os outros, duas realidades diferentes, mas na utopia que desejamos para o mundo as diferenças esbatem-se e convergem numa única realidade. É com esta convicção que a Temporada Darcos apresenta o seu projeto de fusão entre o fado e a música tradicional afegã, através da colaboração entre o Ensemble Darcos e o ANIMP (Afghan National Institute of Music), com o fadista Marco Oliveira e o guitarrista Miguel Amaral. Segundo o mentor e diretor do ANIMP, Dr. Ahmad Sarmast, dezenas de jovens estudantes afegãos fugiram ao terrível regime Talibã, viajando 6.592 quilóme-tros para poderem ter um futuro, e para que a música tradicional afegã pudesse sobreviver. Parece-nos triste e paradoxal que uma tradição milenar necessite do exílio para garantir a sua existência e preservação…
Também sob a égide da união, e visando criar pontes culturais de índole humanista, o mais ambicioso projeto da Temporada Darcos, Europa Sinfónica, será finalmente retomado (em suspenso desde 2020 devido aos anos de pandemia), com a primeira visita a Portugal da Orquestra da Ópera Estatal da Hungria, um dos mais antigos e prestigiados agrupamentos musicais europeus, e com a Orquestra da Toscana, instituição capital daquela região italiana, com sede em Florença. Estes dois programas terão como solistas os aclamados artistas portugueses António Rosado e Eduarda Melo. O ano de 2023 verá ainda nascer o projeto Folias, terceiro livro da série para coro e instrumentos, Novíssimo Cancioneiro, de Nuno Côrte-Real, desta vez inteiramente dedicado às danças portuguesas, reper-tório rico e variado que é mister revitalizar com vista a uma maior presença artística no panorama contemporâneo.
De destacar, por último, a estreia do projeto de fusão estética entre o jazz e o clássico, Nas asas do indefinido, com o Ensemble Darcos e a internacional cantora portuguesa Maria Mendes, procurando caminhos de fusão e desco-berta entre aqueles dois mundos distintos. Podíamos projetar neste último projeto musical, como exercício para as nossas próprias vidas, o caminho que a humanidade parece cada vez mais estar a necessitar: tomar o oposto, o contrário, o aparentemente inconciliável, e conciliá-los; entender as diferenças, aceitar as distinções, compreender as essências, e num desejo sincero de harmonia, conceber um horizonte onde a natureza varia do Homem possa existir pacificamente e sem mácula. Utopia, nunca te esqueceremos!" Nuno Côrte-Real
“A cultura é o grande observatório do humano” José Tolentino Mendonça (2021)
Na sua 16ª edição, a Temporada Darcos propõe um programa artístico que elege “A união pela música” como impulso e horizonte. Longe de constituir um cliché semanticamente esvaziado pela repetição, a afirmação prefigura um manifesto pelo direito a construir uma nova narrativa do futuro.
A Temporada Darcos enraíza-se num movimento cultural agregador de matriz cosmopolita que promove o encontro entre “diversidades”, aprofundando o diálogo, a cooperação e a participação cidadã. Repousa na profunda convicção de que as Artes e a Cultura – conceito poliédrico – devem assumir um papel central e não ornamental no âmago de qualquer projeto de desenvolvimento territorial. Ao longo da sua trajetória, um sistema capilarizado de relações tem sido delicadamente tecido, dirimindo distâncias entre instituições, coletivos artísticos e comunidades.
Na sua dimensão processual, a Temporada Darcos concorre para a edificação de uma ecologia de práticas colaborativas que, assentes na mutualização de experiências, conhecimentos e competências, aportam inovação e abrem caminho a diálogos fecundos materializados em projetos comuns.
Enquanto movimento fortemente comprometido com a educação, inequívoca alavanca de transformação, a Temporada Darcos tem contribuído para salvaguardar a acessibilidade a um patri-mónio artístico em permanente (re) criação e avigorar a literacia musical de uma “vasta maioria”.
A música, na sua pluralidade de expressões, é um universal de cultura, uma linguagem de convergência que nos projeta num espaço identitário partilhado. Em tempos marcados pelo desencanto, incerteza, fragmentação, dissolução e insularidade, a música, mais do que uma experiência salvática, hiperbolicamente escapista, ou de estrita e efémera fruição estética, oferece a possibilidade de pensar novas formas de habitar o mundo, de ousar outras vidas em comum." Ana Umbelino
Direção artística
Nuno Côrte-Real
Consultoria
Afonso Miranda
Projetos especiais
Vanessa Pires / Artway
Textos
José Bruto da Costa
Produção executiva
Bruna Moreira
Assistente de produção
João Barrinha
Gestão de apoios
Jorge Reis
Relações públicas e assessoria de imprensa
Débora Pereira
Contabilidade
Luís Silvestre
Imagem gráfica
Olga Moreira a partir de fotografias de Jorge Carmona
Comunicação e imagem
Câmara Municipal de Torres Vedras