Torres Vedras

Tiago Pombal

13.11.2023

Produtor na Trienal de Arquitectura de Lisboa, tem colaborado regularmente com diversas entidades e organizações culturais e artísticas em Torres Vedras ao longo dos últimos anos. Foi produtor e programador da Transforma, o responsável pelo design da Creative Factory para carros alegóricos e o monumento do Carnaval de 2016 e cofundador do projeto Margem. Hoje é o presidente da Cooperativa de Comunicação e Cultura.

A Revista Municipal [Torres Vedras] está à conversa com Tiago Pombal.

 

Formaste-te em Design de Ambientes pela Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha. O teu sonho era trabalhares como designer na altura?

Esse começo foi inusitado. Inicialmente era para ser analista de análises clínicas ou enfermeiro e, portanto, o meu secundário foi feito na Escola Madeira Torres, no curso de ciências e tecnologias. Aquando da minha inscrição para a faculdade, tomei a iniciativa de colocar como primeira opção algo que sabia que queria fazer, apesar das expectativas na área criativa não serem as melhores, a nível de emprego. Independentemente disso, optei por me formar no que realmente queria e foi uma experiência incrível, o descobrir de um novo mundo. Foram 3 anos muito bem vividos e a partir daí consegui perceber que tinha feito a escolha certa.

 

Desenvolves projetos em várias áreas distintas, ou complementares: música, design, arquitetura. Há alguma que seja mais significativa para ti?

Ás vezes faço essa reflexão. Qual é a minha grande área de interesse? E não tenho, porque sinto que o que eu realmente gosto é de produzir e imaginar um projeto, seja em que área for. Música, fotografia, design, o facto de poder dar corpo a um projeto independentemente do seu género é o que me faz sentir satisfeito e perceber que é dessa forma de pensar e atuar que eu gosto. Não tenho uma área preferida.

 

Em 2013 és convidado a assumir o cargo de produtor e programador na Transforma, em Torres Vedras. Como foi essa experiência?

Foi das experiências mais enriquecedoras que tive. Na altura percebi que o que eu pensava e queria era real: trabalhar na área em que me formei. E com a vantagem de ser no sítio onde cresci e durante uma fase de eclosão cultural em Torres Vedras, pelo trabalho desenvolvido pela Transforma e outras associações locais.

A Transforma desenvolvia atividade em várias áreas e foi onde fiz amigos para a vida. Foi uma atividade muito próxima das pessoas, bem no centro da cidade, ao mesmo tempo que respondia às exigências de programas nacionais e internacionais em que estávamos inseridos. A vontade de continuar a fazer algo em Torres Vedras vem muito do bichinho que a Transforma criou em mim.

 

Falaste no próprio edifício da Transforma. Esse projeto e outros que acabaste por desenvolver fez-te olhar para Torres Vedras com outros olhos?

Fez-me olhar sobretudo porque estando de fora consegues perceber o que é o projeto desse edifício, mas estando por dentro percebes ainda melhor a importância daquela estrutura. É possível teres edifícios com esta qualidade em sítios que não são grandes metrópoles, o facto de saberes que em Torres tens uma estrutura daquelas, independentemente do seu presente e do que será o futuro, é importante. Aquela é uma estrutura que está na cidade e só poderá servir a cidade, porque é nela que está e isso é um legado que fica.

 

Torres Vedras consegue competir com outras metrópoles na sua programação?

Consegue, até porque acho que isso é muito evidente. Há uma perspetiva de presente e futuro e este passa por esta ideia de descentralização. Há uns anos estava na faculdade e havia muito este desejo de querer ir para grandes cidades e isso tem perdido força. Há uma qualidade de vida que só se consegue encontrar em cidades como Torres Vedras e a nível de equipamentos e programa sem sombra de dúvida. É muito importante que as pessoas da minha geração não percam o rumo quanto ao trabalho que podem fazer nestas cidades. Nós somos também responsáveis por conseguir fazer essas pontes entre aquilo que são as grandes metrópoles e as cidades e concelhos como Torres Vedras.

Em 2016 foste o designer criativo do projeto de Carnaval da Creative Factory. Como foi essa experiência?

Esse foi um desafio lançado depois da Transforma numa altura em que sentia que não podia estar parado. A Ana Martins convidou-me a desenvolver o projeto da Creative Factory e eu tinha uma coisa muito boa, que é a veia de folião torriense, mas não tinha o saber ao nível da ilustração. Falei com o Vasco Duarte, que tinha estudado comigo na ESAD e arranjámos forma de desenvolver o nosso trabalho, que foi aliás feito por toda a equipa da Creative que abraçou a parte técnica.

Lembro-me de termos entregue a candidatura e recebermos os resultados e nem queríamos acreditar. Foi a primeira vez que uma nova empresa produziu o monumento e 3 carros alegóricos, entre os quais o dos reis. Desde miúdo que tenho uma paixão pelo nosso Carnaval e foi engraçado porque este trabalho foi muito duro e ironicamente foi o primeiro ano em que não aproveitei o Carnaval. Acho que dormi durante 2 ou 3 dias.

 

Apesar de trabalhares em Lisboa e viajares muito, estás muito ligado a Torres Vedras. Fala-nos disso.

Há uma coisa que me acontece e que penso que a outras pessoas, que é: quanto mais viajo, mais gosto de saber que volto cá. E isso tem sido uma constante ao longo dos anos. É muito importante saberes definir o teu conceito de casa e eu tenho sempre esse compromisso, de saber, quando vou a algum lado, que tenho para onde voltar. É uma mais-valia sobretudo no que é a tua construção pessoal e profissional. Saber que há um mundo lá fora, mas que não há nada como voltar a casa. 

 

Qual foi o teu primeiro contacto com a Cooperativa de Comunicação e Cultura (CCC)?

Foi exatamente na Transforma, porque estávamos em projetos que trabalhavam em rede. Tive o primeiro contacto com a Cooperativa e a Inês Mourão em 2013. Havia muita coisa a acontecer. A cidade sofreu uma grande transformação com o “Torres ao Centro” e eu, apesar de ser de cá, quando vinha, sentia que estava numa cidade diferente. Andava à pesca (no bom sentido!). Havia realmente uma atividade intensa a nível de associações também. O primeiro contacto com a Cooperativa foi nessa altura, como visitante das exposições que aconteciam aqui, na Câmara Escura e na Câmara Clara. Eu vim à inauguração deste edifício onde estamos. E depois foi uma ligação que se foi intensificando.

  

E agora és o seu presidente. Qual é o futuro da CCC?

O futuro da Cooperativa é muito denso e esperemos que seja tão longo quanto é o seu passado, já lá vão quase 44 anos. Estamos neste momento com uma nova Direção, que não é tão nova assim porque os atuais órgãos sociais devem muito ao que foram os anteriores. Estamos com muita calma a perceber o que foi a Cooperativa, tendo a meta dos seus 50 anos. No último ano candidatámo-nos a uma série de apoios e tivemos de pensar numa forma profunda sobre o que é a CCC e o seu edificado. Não se trata apenas de produzir exposições e atividade, mas temos de preservar o seu acervo e história e tornar a Cooperativa ainda mais aliciante no programa que desenvolve, criando proximidade junto dos mais jovens e criando benefícios para os sócios. Temos de pensar também no desenvolvimento sustentável da associação e no que é o seu planeamento financeiro.

Vamos reabrir a cafetaria, pelo que será um espaço que durante o dia pode ser frequentado. As pessoas vão poder usufruir do que estiver a acontecer e do acesso à Biblioteca, que conta com mais de 2600 publicações nas áreas especializadas da CCC. Estamos também num processo de transformação do último piso da Cooperativa para que se torne uma residência artística que sirva o seu programa, mas também de outras associações. Tentamos apostar num serviço público partilhado, dentro do que é a nossa atividade.

O terraço e este espaço onde estamos na Câmara Escura vão dar apoio a uma nova linha de serviço educativo e mediação cultural que estamos a desenvolver e que queremos aplicar no início do próximo ano. Vamos também repensar e executar um plano de serviços através dos nossos laboratórios de fotografia, digital ou analógica, e através projeto da loja de autor. É uma panóplia de linhas de trabalho que são um excelente sinal, um sinal de vida.

Última atualização: 13.11.2023 - 17:07 horas
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