Torres Vedras

José Gonçalves André

01.03.2012

José Gonçalves André, diretor do Centro Hospitalar de Torres Vedras

José Gonçalves André é desde Abril de 2010 diretor do Centro Hospitalar de Torres Vedras (que congrega o Hospital Distrital de Torres Vedras e o Hospital Dr. José Maria Antunes Júnior), depois de durante quatro anos ter desempenho as funções de vogal do respetivo conselho de administração. Na entrevista que concedeu recentemente à [Torres Vedras] fez um ponto de situação em relação ao actual funcionamento daquele centro hospitalar, tendo ainda abordado outras temáticas como o seu percurso profissional, o panorama local e nacional na área da saúde, a relação com a Câmara Municipal e o futuro da entidade que dirige. Confiança e optimismo são duas ideias-base com que segundo Gonçalves André se deve encarar o presente e o devir… 

 

Em primeiro lugar pedia-lhe para falar um pouco sobre a sua experiência no Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Torres Vedras e o seu percurso profissional…

Tem sido uma experiência bastante agradável, que de alguma forma vem no seguimento de outras experiências que tive ao nível da gestão hospitalar no país, onde já fui vogal do conselho de administração ou director de hospital, em Lamego, na Covilhã e em Mirandela. Também passei pelo Ministério da Saúde, como dirigente, na área dos recursos humanos. O cargo que desempenho agora é de alguma forma um corolário da minha carreira de gestor hospitalar. Torres Vedras continua a ser um desafio interessante pela sua diversidade, pela sua especificidade. Vim encontrar aqui uma região muito rica do ponto de vista humano, de actividade, de dinamismo, e isso conjugado com os objectivos que queremos alcançar é muito enriquecedor. Sinto-me bem nesta função apesar de todas as dificuldades que passamos e às quais o centro hospitalar não é alheio. É de facto um desafio grande mas que encaro com entusiasmo.

Qual é a sua opinião em relação ao panorama da saúde no concelho de Torres Vedras? Há inclusivamente quem considere Torres Vedras uma espécie de cidade da saúde tendo em conta a oferta bastante completa que tem nessa área…

Sim, a saúde na região do Oeste Sul reflecte de alguma maneira o dinamismo, a diversidade, o desenvolvimento que Torres Vedras tem vindo a ter nos últimos anos. De facto, têm surgido unidades de saúde privadas que representam bem esse dinamismo. Os serviços de saúde estão numa procura de melhoria da sua qualidade, de forma a satisfazer, enfim, a população que aqui reside. Procuram em estreita articulação responder aos problemas de saúde que existem. Tem sido muito interessante esse interface entre as várias instituições. Já há alguns projectos interessantes a que queremos dar corpo que dizem exactamente respeito a essa colaboração entre serviços, que é por exemplo, fazer uma ligação de profissional a profissional, para que o médico, o enfermeiro ou o técnico possa conhecer toda a informação clínica do doente, esteja ele no hospital, no centro de saúde ou até em outro sítio. Apresentámos inclusivamente um projecto ao QREN que designámos de “Balcão Único do Oeste Sul” que é exactamente uma plataforma de rede informática que poderá vir a fazer uma ligação entre todos os serviços de saúde, podendo também beneficiar disso as próprias câmaras, as juntas de freguesia, os lares, enfim, um conjunto de instituições. Mediante esse projecto um utente poderá marcar à distância a sua consulta, aceder a informação na área da saúde ou saber até o resultado de um exame.

Não temos de ter receio de uma colaboração entre a oferta pública e privada, desde que seja uma colaboração saudável. Temos que nos articular porque no fundo quem beneficia com isso são os utentes, a população que servimos.

Pode-se dizer que o centro hospitalar está actualmente a funcionar convenientemente?

O centro hospitalar tem de facto algumas dificuldades mas que têm vindo a ser ultrapassadas, conseguindo-se com isso obter um resultado cada vez melhor. Nos últimos anos tem-se assim vindo a verificar uma melhoria na prestação de cuidados. Os inquéritos de opinião referem isso, que a qualidade do serviço que prestamos no hospital é melhor do que aquela que prestávamos. É claro que isso só é possível porque temos um corpo clínico constituído por pessoas que se empenham e que entenderam esta linguagem de integração e conjugação de esforços para atingir o objectivo da qualidade. Depois, temos também vindo a ter a oportunidade de melhorar os recursos ao dispor da população. Posso-lhe referir, por exemplo, o TAC, a cirurgia de ambulatório, enfim, há alguns projectos que pusemos em marcha que traduzem essa melhoria em termos da qualidade. No que respeita à certificação, que é uma prioridade nossa, já certificámos a farmácia, agora vamos certificar a cirurgia de ambulatório, o laboratório de análises clínicas e o serviço de sangue, e por ai adiante. Os serviços com um modelo de funcionamento mais aperfeiçoado respondem melhor às solicitações e também emanam outro tipo de energia para os outros. Isso traduz-se numa melhoria na prestação de cuidados e numa redução de custos a prazo.

Tem havido contudo problemas com o centro hospitalar ao nível do pagamento a fornecedores e a bombeiros…

O centro hospitalar não está divorciado das dificuldades do país e da saúde em particular. De facto, temos nos deparado com dificuldades financeiras grandes e isso obriga-nos a ter uma política de maior integração com outras unidades. O Ministério da Saúde neste momento está preocupado em fazer a requalificação e reestruturação da rede, seja de cuidados primários seja de cuidados hospitalares, no sentido de rentabilizar os meios que tem e de adequar a sua capacidade financeira à situação actual. É assim em todo o lado, até no próprio orçamento familiar. Não é possível continuar a acrescentar mais gasto sem ter uma contrapartida de rendimento.

Houve também recentemente alguns outros problemas com o hospital distrital relativos a uma bactéria detectada na área de internamento, ao funcionamento da sua VMER (Viatura Médica de Emergência e Reanimação) e às ecografias. São situações que já estão solucionadas?

Sim, completamente solucionadas…

Existe actualmente a possibilidade real do encerramento da maternidade e de outros serviços do hospital?

Não há nenhuma decisão sobre isso. O que nós sabemos é que o Oeste vai ter uma reestruturação em termos da rede hospitalar. Já foi declarado que haverá alterações, e é normal que perante uma situação de excepção se procurem soluções. O ministério estará atento para fazer uma reestruturação que no fundo procure ir ao encontro de uma maior rentabilização dos meios mas que responda às populações. Mas para já não há nenhuma decisão tomada, não há nada definido sobre isso.

E em relação à contratação de médicos, isso é uma dificuldade que está ultrapassada?

A contratação de médicos tem sido de facto um problema, mas que temos conseguido apesar de tudo atalhar. O ministério tomou algumas medidas no sentido de racionalizar o custo das contratações, diminuindo o preço/hora do médico. Houve algumas resistências, mas as empresas de fornecimento de pessoal médico já entenderam que se têm de conformar com isso. Às vezes acontece que não há muita facilidade em arranjar médicos em algumas áreas, mas apesar de tudo as coisas estão melhores hoje do que estavam há relativamente pouco tempo atrás.

Para si quais são os pontos fortes do hospital?

Eu acho que a qualidade é um ponto forte, temos um serviço com muito melhor qualidade actualmente. Do ponto de vista da organização do hospital as coisas estão melhores, temos um sistema de gestão interna que permite ir acompanhando os objectivos que foram fixados para cada um dos chamados centros de responsabilidade. Temos também de facto pessoal médico qualificado. Relativamente à relação com os centros de saúde, é igualmente um ponto forte. Aliás é um aspecto que eu considero bastante importante, a relação do hospital com o exterior, o hospital não pode ter muros. O hospital é uma grande instituição, que emprega muita gente, que tem uma relação muito grande com o exterior e por isso deve-se cultivar essa relação. E felizmente temos tido oportunidade de contar com boas relações com o exterior, quer sejam escolas, seja a Câmara, sejam instituições de solidariedade social, ou mesmo empresas privadas que têm vindo a colaborar connosco em termos de mecenato. Também devo referir que temos dado facilidades ao nível de estágios.

Falava da Câmara Municipal como entidade que colabora com o hospital e que tem-no feito ao nível de parcerias em eventos e em projectos na área da saúde. Tem sido uma relação positiva?

A Câmara sempre mostrou muita disponibilidade para apoiar o hospital em várias áreas e isso é muito salutar. Porventura a Câmara estará em melhores condições para nos apoiar do que nós apoiarmos a Câmara, mas estaremos sempre disponíveis a apoiá-la se nos for possível. Mas é de facto uma nota que gostava de salientar, porque tem havido sempre resposta da parte da Câmara Municipal às questões que lhe temos colocado.

A Câmara Municipal tem desenvolvido um trabalho interessante na área da saúde, com um conjunto de iniciativas como o Plano de Desenvolvimento em Saúde, a Feira da Saúde, acções no campo da culinária saudável ou o apoio a projectos de outras entidades. Tem uma opinião positiva em relação a esse trabalho?

Sim, tenho uma opinião positiva. A saúde é sempre um grande investimento para a população. Sem saúde nada se faz, uma população saudável é o princípio de tudo, é o princípio da sua actividade e até da sua felicidade.

Recentemente foi aberto o novo hospital de Loures. Esse facto teve implicações para o centro hospitalar?

Sim, tendo em conta que essa unidade de saúde abrange quatro freguesias do concelho de Mafra e o concelho do Sobral de Monte Agraço, o que representa 30 e tal mil pessoas.

Há alguns anos falou-se também num alargamento do Hospital de Torres Vedras ou até numa relocalização. Tem alguma informação sobre essa situação?

Não. De facto falou-se em tempos dessas hipóteses, mas tal nunca avançou. Há alguns anos atrás poderiam ser soluções, mas dado o contexto financeiro actual não é fácil equacionar essas situações. Poderá ser um dia, porque não? Torres Vedras é uma terra que cresce, tem uma população activa, juventude, um dia, porque não? Isto é uma fase passageira…

Há quem considere que o Estado tem vindo a desinvestir na área da saúde e com isso até a colocar em causa um dos pilares da Constituição. É da mesma opinião?

Eu não considero que tenha havido um desinvestimento. Eu acho que o Ministério da Saúde é um dos ministérios que gasta mais e naturalmente que vai ter de se conformar a valores muito mais baixos, mas de facto não me parece que tenha havido desinvestimento. Tem havido é uma alteração de política. Por um lado, rentabilizando-se melhor os meios que existem, por outro, avançando-se com as parcerias publico-privadas.

O Serviço Nacional de Saúde é uma das grandes conquistas do 25 de Abril. Concorda?

Sem dúvida. As pessoas que estiveram na base do Serviço Nacional de Saúde tiveram uma ideia interessantíssima, de grande valor social. Realmente o SNS permitiu um grande salto qualitativo do ponto de vista da saúde das pessoas. Nós temos, aliás, em algumas áreas da saúde um ranking bastante favorável em termos internacionais, e isso deve-se também ao Serviço Nacional de Saúde e à estrutura que foi criada na altura. Foi, de facto, uma ideia muito feliz, e que tem vindo a evoluir, mantendo os pressupostos-base, mas naturalmente com alguns acertos porque não há outra via.

Se estivéssemos num ciclo económico favorável e existissem possibilidades financeiras para tal, que apostas de melhoria faria no centro hospitalar?

Eu apostaria na mesma estratégia, da melhoria da qualidade dos serviços que já temos. Se fosse num plano mais vasto, estudaria melhor a procura e veria que serviços se poderiam de facto criar. Mas o fundamental é fazer-se bem aquilo que já se faz. Não devemos ter a ideia de que devemos fazer tudo. Essa ideia é errónea. O caminho é aprofundar a nossa organização na qualidade da prestação de cuidados.

Existem alguns aspectos na área da saúde no concelho que considera que pudessem ser melhorados?

Eu sei, por exemplo, que os centros de saúde têm algumas lacunas. Eu acho que a área dos cuidados primários devia ser dotada de mais médicos para tratar numa primeira linha os doentes. E isso era muito importante também para nos apoiar. Porque estamos integrados numa rede e os doentes deviam vir referenciados. É isso que se passa no estrangeiro.

Gostaria de deixar alguma mensagem aos leitores da revista?

Temos de encarar o futuro com confiança, numa perspectiva positiva e ver o hospital também como um factor de progresso, que pretende de facto responder cada vez melhor às solicitações da população. Naturalmente, não só o hospital, mas todo o sistema que está à volta do hospital. Na altura difícil que estamos a passar se não tivermos uma atitude positiva as coisas tornam-se ainda mais complicadas…   

Entrevista extraída da edição nº7 (março/abril de 2012) da revista municipal [Torres Vedras]

Última atualização: 13.08.2019 - 12:37 horas
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