Torres Vedras

Maio de 1968

01.05.2016

Primeira página do Jornal Badaladas, 1986

Em França, crescia um mal-estar no seio dos estudantes, que tendia a agravar-se desde março de 1968, culminando num conjunto de manifestações, nos meses de maio e junho deste mesmo ano. Próximo de Paris, em Nanterre, cidade tradicionalmente apelidada de feudo ‘esquerdista’, iniciara-se um movimento de contestação à então sociedade de consumo, ao ensino tradicional e à insuficiência de saídas profissionais. A ocupação da Universidade de Paris, em Nanterre, em 2 de maio, obrigou ao seu encerramento, acontecimento simbólico, que seria o primeiro de uma série de rebeliões que tiveram lugar ao longo de maio, prolongando-se pelo mês seguinte. Desde então, Daniel Cohn-Bendit assumiu a direção do movimento, que se alastrara de modo rompante à capital francesa, com os estudantes a ocuparem a Universidade de Sorbonne, que encerraria no dia seguinte. Doravante Paris tornara-se o palco de tumultos alimentados pela provocação e repressão, muitas vezes com fortes ‘cargas policiais’, dando origem a um ambiente de tensões permanentes.

A 13 de maio saíram às ruas de Paris, em manifestação, 600 mil estudantes. O conflito, até então estudantil, alargara-se ao setor social, juntando-se a força dos sindicatos no movimento de contestação, com uma greve, convocada por uma importante federação sindical, que envolveria cerca de 10 milhões de trabalhadores em França, levando a que os patrões, na procura do apaziguamento do operariado, efetuassem aumentos de 10% dos salários e de 35% no salário mínimo. O governo chefiado pelo então primeiro-ministro Georges Pompidou perdera o controlo da situação, momento em que o presidente Charles De Gaulle efetuou a proposta de um referendo, não tendo sido, porém, ouvido. A crise estudantil, que culminaria                 a 16 de junho com a morte do estudante Gilles Tautin, e a crise social originaram uma crise política, terminando na dissolução da Assembleia Nacional, em 24 de maio. De Gaulle convocou eleições para junho, que teriam lugar nos dias 23 e 30, tendo sido vencidas por aliados seus, retomando o governo o controlo da situação política, ao mesmo tempo que, parecia, que a crise acabava.

Este movimento de contestação alastrou-se a diversos países então considerados desenvolvidos, de que são exemplo os Estados Unidos da América e o Japão. Em Portugal, alguns dos seus ecos estiveram na crise estudantil de 1969, sobretudo em Lisboa e em Coimbra, um contágio do Maio de 68 ocorrido em França, mas não apenas, quando as grandes bandeiras nacionais eram a luta contra a ditadura e a luta contra a guerra colonial, e se tratava da terceira vaga de oposição estudantil ao governo na década de 60, depois dos movimentos de 1962 e 1965. No nosso país, A crise estudantil de 1969 também teve ‘baixas’ políticas, tendo provocado a demissão do ministro da Educação e, infortunadamente, o envio dos “estudantes mal comportados” para a guerra colonial.

Logo em 1968, o jornal Badaladas deu notícia desses acontecimentos, nas edições de 13 e 20 de julho, naquela em texto intitulado “França: um teatro de greve”, assinado por D’Andrade Santos, nesta em texto com honras de primeira página sob o título “A nova Revolução Francesa”. Certo é que o Maio de 1968 trouxe a mudança, logo atestada em junho, e, desde então, tudo seria diferente, com a abertura das mentalidades, ainda que demorada, acreditando todos que nada seria como antes de Maio de 68, como se regista em um dos seus slogans: “Corre camarada, o velho mundo está atrás de ti”. Começa, tanto ali como aqui, a levantar-se a voz das minorias, num movimento contestatário que seria a antecâmara da realidade dos anos 70 e 80 do século XX, em Portugal sobretudo depois da Madrugada de Abril.

Carlos Guardado da Silva

 

Última atualização: 13.08.2019 - 15:35 horas
voltar ao topo ↑