Torres Vedras

Paulo Quintas

01.07.2019

Fotografia de Paulo Quintas em frente a um dos seus trabalhos: uma tela de grande dimensão, com fundo amarelo, em que se vêem dois círculos entrelaçados e pintados a preto.

“Uma pintura minha começa com qualquer coisa do mundo, mas depois termina fora do mundo” afirma Paulo Quintas. “Acho mais interessante que a arte mostre coisas que não são biológicas, naturais, químicas ou astronómicas, mas que sejam do interior humano” partilha o artista plástico, que reside no concelho de Torres Vedras, e que não tem dúvidas de que “o trabalho artístico é o paradigma da atividade mais livre de todas.”

Uma perspetiva que coincide com o caminho trilhado pelo artista e que dá origem a uma “experiência experimental acumulada”, conclusão que partilha entre risos, à medida que é desafiado a fazer um exercício de memória. “Claro que existem linguagens na arte, mas as pessoas têm de se libertar delas, têm de ter uma voz pessoal”, acrescenta. “Pelo menos é isso que se espera do artista.”

A dimensão de autodescoberta da arte está vincadamente presente no seu trabalho e fornece as ferramentas necessárias para que, aos dias de hoje, seja docente na Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha, fazendo tutoria no último ano de licenciatura. “Fazer com que as pessoas concretizem ao máximo aquilo que as levou lá” é o que procura, à medida que orienta o processo individual de cada um.

A conversa decorre entre paredes forradas a enormes telas em que Paulo trabalha, num verdadeiro refúgio entre a serenidade do Oeste. “Queria ser músico” avança, ao contar que o contacto com a arte não surgiu logo com a pintura, mas com o piano. “Não se desenvolveu a prática, mas manteve-se o gosto pela música” diz, apontando o dedo à pressão em torno do nível de desenvolvimento técnico que se exigia em “tenra idade”.

Seguiu-se um hiato de vários anos “em que não aconteceu nada relacionado com arte.” Até que lhe ofereceram uma máquina fotográfica que se viria a assumir como a porta para o mundo da criatividade e da experimentação.  Começou a tirar fotografias por volta dos 16 anos, seguindo-se sessões fotográficas em séries de 36 fotografias (tal como o rolo permitia), a preto e branco, com 400 ASA.

“Esse impacto de ver qualquer coisa que eu desconhecia, que era completamente distinto da experiência de fazer, foi uma grande revelação.” Daí à entrada no mundo da pintura, foi um pequeno passo. Afinal, quando frequentava o segundo ano nas Belas Artes de Lisboa, Paulo Quintas “já trabalhava tanto” que acabou por apresentar a sua primeira exposição individual, numa galeria, em 1990.

“Quando estou a pintar, estou sempre a desenvolver pensamento poético e plástico” diz, sobre o processo criativo. “Existem pequenas ideias, visuais ou plásticas, que são necessárias para eu começar a trabalhar.” A partir daí, o processo é feito de paragens e recomeços. “Eu até gosto de entrar no ateliê e sentir alguma estranheza. E isso consegue-se quando se para”, explica.

“Esta ideia de parar também tem a ver com tentar perceber o estado do mundo, o meu estado no mundo e dar oportunidade para criar algumas ruturas.” Ruturas ou a ilusão delas - como acaba por refletir -, a verdade é que o Renascimento e a Revolução Industrial são duas épocas que estuda frequentemente e que vê como “dois grandes momentos do passado que estão absolutamente vivos”.

Todos os títulos estão errados foi a exposição antológica patente na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional, em Lisboa, no ano passado, que agrupou trabalhos realizados entre 1984 e 2018. Voltar a ver fisicamente estas obras levou a uma nova “revelação”: afinal, “os grandes fragmentos, as grandes ruturas, as grandes mudanças” estavam todos “muito ligados”.

De momento, Paulo Quintas encontra-se a preparar uma exposição para a galeria Maria da Graça Carmona e Costa, em Lisboa, e outra para a Galeria Presença, no Porto. Duas exposições compostas por “trabalhos muito distintos uns dos outros”, mas que comungam do mesmo propósito. “O mais importante é ficar.” Porque, como explica, “tudo o resto morre e desaparece, inclusive o próprio artista. E as obras ficam.”

Última atualização: 17.01.2020 - 12:47 horas
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