Torres Vedras

Rui Horta Pereira

10.11.2022

Pormenor de

Rui Horta Pereira é formado em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. O artista expõe com regularidade desde 2010, é representado pela Galeria das Salgadeiras e nos últimos anos obteve apoios à criação por parte de entidades como a Fundação Calouste Gulbenkian e a Direção-Geral das Artes. O frágil culto do desenho foi a exposição individual que levou à Paços - Galeria Municipal de Torres Vedras, em 2011. Já este ano, integrou a exposição coletiva Salada, que esteve patente até ao passado dia 18 de junho. 

 

“A arte tem que comunicar livremente, tem que ser livre, livre do seu criador.” É uma frase sua. Quando é que se deu o seu encontro com a arte? Ou quando é que a arte o encontrou?

Fomo-nos encontrando não sei precisar, mas tenho memórias muito antigas de alguns acontecimentos determinantes, ou pelo menos que reconheço agora como determinantes a nível familiar, da minha mãe, do meu pai ou da minha avó. Intrometia-me no meio do que eles faziam, observava, queria saber e participar. Mais tarde tive especiais incentivos nas escolas, refiro escolas para ser justo, pois aconteceu em todas de alguma forma pela mão de professores, quem mais, e a mão dos professores vale muito! A saber, professora Virgínia, professora Teodolinda, professor Abel, professor António Coxo, professor Carlos Guerra, estes diretamente relacionados e influentes, os outros igualmente envolvidos. Um privilégio extensivo a outros colegas.

 

O acaso, a experimentação e a descoberta fazem parte do seu processo de trabalho. Seja nas pinturas, em desenhos ou esculturas. Pode partilhar connosco esse processo criativo de artista “equilibrista, um autor em permanente de-autorização”?

A marcar autoral, ou seja, um conjunto de características que identificam o trabalho de um artista, dito de uma forma simples, continua a ser para mim um mistério e um desafio, talvez até seja o tema global do meu trabalho. A minha motivação está em encontrar processos, incorporar elementos que desconheço, só se consegue experimentando em permanência, é uma posição, uma ação, uma atitude. Vou sempre abrindo caminho, umas vezes resulta, outras dá para o torto. Tem um lado encantatório e não tem receita, isto é, pode desenvolver-se, o dito processo de pesquisa e criação, partindo de algo que já ensaiei ou de um detalhe de uma notícia.

Imaginem esta imagem: um personagem que salta à corda muito bem sem sair do sítio, em dado momento tropeça na corda, mas não cai, como é um bom ginasta, aproveita e dá uma cambalhota, aproveitando assim o movimento. E continua a saltar, e depois repete-se o tropeço e a cambalhota transforma-a num mortal, e percebe que consegue progredir, fazer variações na cambalhota, no ritmo na passada, etc. Vamos sempre acrescentando complexidade e estamos sempre a redefinir o que é essencial, eu pelo menos não sei se alguma vez chegarei a desvendar o mistério que me impele. Para ser honesto espero que não, ou fico sem nada para fazer. 

 

Em 2011, a Paços – Galeria Municipal acolheu a exposição individual O frágil culto do desenho. Qual foi o conceito da exposição? E como decorreu o seu processo de construção?

É longínquo… Mas cá vai. Recordo que tinha uns papéis que preparava com acrílico e tinta da china. Ensaiava, como habitualmente, o cruzamento entre operações da escultura e o desenho. Preparava os papéis e tencionava retirar a tinta raspando de alguma forma. Rapidamente resolvi “polir”, “lixar”, mas queria ter um elemento que perturbasse esse desempenho e, sobretudo, que lhe acrescentasse um propósito. Um elemento subtil que permitisse um reconhecimento mesmo que vago. Usei então um conjunto de sacos de plástico, que dispunha por baixo dos papéis e que, em função das suas dobras e da pressão que eu fazia com a lixa, iam fazendo surgir fantasmas, imagens incompletas, um conjunto de elementos difusos gerados por subtração de papel e tinta. O processo é muito direto e determinante na construção da imagem, que por sua vez se revelou bem complexa e inquietante.

  

Recentemente, neste ano de 2022, voltou a expor na Paços com a exposição Salada, em coletivo com Mariana Gomes e Pedro Valdez Cardoso. Pode partilhar um pouco sobre o que tem produzido nos últimos tempos?

Vou ser um pouco vago, não para escapar à pergunta, mas apenas por dificuldade em objetivar. Tenho datas incertas para apresentar trabalho o que significa que primeiro retomo as minhas rotinas de trabalho em várias frentes, segundo, pesquisa e investigação em estado disperso e pouco sistemático - o que não é o mesmo que desorientado -, tendo a arquivar e inventariar pequenas experiências e dar continuidade a outras. Diria, pois que, dias normais no laboratório, sem produção específica ou retorno garantido, mas das 9 até às horas que a energia der.

 

Legenda das fotografias:

Fotografia 1 - Pormenor de Falso pêndulo, acrílico sobre papel, 70x50 cm, 2022
Fotografia 2 - Perseguindo as estrelas, tinta da china e acrílico sobre papel mata-borrão, 122,5X85 cm, 2022
Fotografia 3 - Pó de asteróide, acrílico sobre gesso, 30x23x1,5 cm, 2022

Publicado: 10.11.2022 - 14:24 horas
voltar ao topo ↑