Livro onde devem ser inscriptos os nomes das mulheres solteiras não recatadas
01.03.2018
Título Livro onde devem ser inscriptos os nomes das mulheres solteiras não recatadas, que forem intimadas para darem conta dos partos
Data 1871-1877
Dimensão e suporte 1 livro; papel
A fiscalização das mulheres grávidas não casadas foi uma preocupação assumida, pelo menos, desde Filipe I de Portugal que, nas Ordenações Filipinas, obrigou os quadrilheiros a informarem as Justiças das mulheres grávidas de que “se suspeite mal do parto, não dando delle conta”. Mais tarde, o alvará de 18 de outubro de 1806, reforçou a obrigatoriedade, determinando que as Justiças “obriguem as mulheres solteiras que se souber andarem pejadas, a dar conta do parto e a criarem o filho, sendo possível, ou a todo o tempo que souberem dos pais, a pagarem a criação e tomarem conta de seus filhos”.
Todavia, os tempos conturbados vividos no Reino na primeira metade do século XIX, nomeadamente com as invasões francesas, a transferência da capital do império para o Rio de Janeiro, as convulsões políticas, a guerra civil e a instabilidade dos primeiros anos do liberalismo, não permitiram concretizar reformas e inovações que, não obstante, foram recuperadas após a Regeneração, a partir de 1851.
No Arquivo Municipal de Torres Vedras existe apenas um livro que atesta a fiscalização das mulheres grávidas não recatadas - Livro onde devem ser inscriptos os nomes das mulheres solteiras não recatadas, que forem intimadas para darem conta dos partos – com registos entre 1871 e 1877.
O livro foi dividido em duas partes: Livro para serem lançados os nomes das mulheres solteiras não recatadas residentes nas freguesias d’ este concelho, que achando-se gravidas, devem ser intimadas para darem conta dos partos, na qual se registaram cento e trinta e duas grávidas; e nota das mulheres que tendo sido intimadas derão seus filhos à luz, e qual o distino que as mesmas tiveram, com o registo de cento e vinte e duas parturientes.
Na primeira parte era registado o nome, a filiação e a residência da grávida considerada não recatada porque, normalmente, era solteira, com sinais evidentes de gravidez, mas também poderia ser viúva ou mesmo casada, quando se suspeitava que o filho não era do marido; o tempo de gravidez; e a identificação e residência do pai da criança que, porém, permanecia muitas vezes incógnito.
Na segunda parte assentavam-se os nomes das parturientes, a data da primeira intimação, ainda durante a gravidez, e as observações, onde se registava a informação relativa à segunda intimação, que ocorria após o parto, uma vez que as mulheres eram obrigadas a apresentar o filho recém-nascido e a criá-lo ou a referir o nome de quem o iria criar. Se não existisse ninguém que garantisse as condições económicas para tal, e só nesse caso, a criança era admitida no hospício, onde se recebiam os órfãos e abandonados, e as suas despesas eram pagas com dinheiros públicos.
Com efeito, a fiscalização a mulheres grávidas não recatadas servia como forma de moralizar os comportamentos considerados desviantes e de evitar infanticídios, mas principalmente para reduzir a despesa pública, diminuindo o número de expostos ou abandonados.
A consulta da documentação permitirá a investigadores e curiosos estudos estatísticos sobre os filhos ilegítimos e o conhecimento da identidade e freguesia de morada das grávidas e dos pais das crianças, quando eram identificados, assim como do destino dos recém-nascidos, que variava entre serem criados pelas mães, falecerem pouco depois do nascimento e serem admitidos no hospício.
Para complementar o estudo da informação sobre o nascimento de filhos de mulheres não recatadas, aconselha-se também a consulta, no Arquivo Municipal, da documentação relativa aos expostos, que abrange o período cronológico entre 1788 e 1888.
Paula Correia da Silva