Paulo Brighenti
01.04.2023
“Comecei a perceber que tinha habilidades para o desenho talvez em aulas de ciências, em que era preciso desenhar uma imagem de organismos no quadro.” É este episódio que Paulo Brighenti recorda ao som do chilrear de pequenas aves, quando desafiado a pensar no momento em que percebeu que iria trilhar o caminho da criação artística ao longo da sua vida.
Seguiram-se duas provas de desenho para entrar em Belas Artes que fizeram com que tivesse “de encontrar outra alternativa e fazer um outro esforço.” Mais tarde, haveria de ser convidado para fazer apresentações no doutoramento de desenho. “É engraçado como vou àquela escola, mas de outra forma” conta, entre risos, sobre as voltas que a vida continua a dar.
Esteve ligado ao Ar.Co – Centro de Arte e Comunicação Visual durante 21 anos, primeiro como aluno, depois a trabalhar na biblioteca para pagar as propinas. “Foi uma grande aprendizagem. Vi muita coisa, desde a arte contemporânea portuguesa dos anos 60 até aos anos 2000.” Posteriormente, foi convidado para ser professor e coordenou o Departamento de Desenho e Pintura.
A ligação ao ensino fortaleceu-se e deu origem à MArt. “Foi um projeto muito interessante, que depois tomou um aspeto mais utópico, pela ligação a uma escola de 2.º e 3.º ciclo numa zona difícil em Lisboa” conta, sobre a escola de arte que fundou, onde lecionou e foi coordenador pedagógico até dezembro de 2019.
Nessa altura, surgiu a ideia de procurar um espaço fora da cidade. Viria a encontrá-lo no concelho de Torres Vedras, mais concretamente em Maceira, na União das Freguesias de Carvoeira e Carmões. Com ajuda de Ana Margarida Sousa e Jorge Bonifácio, haveria de nascer a RAMA – Residências Artísticas Maceira Alfeiria. Desde 2020, já passaram pelo projeto 62 artistas nacionais e internacionais.
“O seu espaço de trabalho [dos artistas] é sempre um bocado precário. Andamos sempre com a casa às costas. Comecei por ter o ateliê no meu quarto” conta, para recordar desafios e conquistas quanto aos espaços que se sucederam. Além do estúdio, que funciona numa antiga adega, a RAMA conta com alojamento para residências artísticas na antiga Escola de Alfeiria. “Não me consegui desligar de ter um projeto à parte. Se calhar habituei-me a ter essa espécie de alimento exterior.”
Paulo Brighenti percorre o trajeto de 45 km que distancia este espaço do local onde vive todos os dias. “Acho que esta mudança foi uma oportunidade” afirma, para partilhar como o contacto com o exterior abriu novas portas no seu trabalho. “Comecei a usar cera de abelha, que compro aqui a apicultores locais, ou cimento, barro, cobre, madeira, pedras, coisas que vou trazendo do exterior para aqui.” No campo, não falta matéria prima nem inspiração. “Até caminhadas que faço pelo campo, são sempre inspiradoras. São sempre momentos de uma certa meditação, de reflexão e de pausa.”
Em fevereiro, esteve na ARCOmadrid a convite das Galerias Municipais de Lisboa / EGEAC, onde apresentou uma pintura de grande formato e uma pequena escultura. Segue-se Braço Cruzado, exposição com David Correia Gonçalves (que também já passou pela RAMA) que estará patente na galeria Brotéria, em Lisboa.
Texto: Rita Santos
Fotografia: Paulo Brighenti e Eduardo Sousa Ribeiro (cedida por Galeria Belo-Galsterer)
Legenda:
1 - Cascata, 2022. Cimento, pigmento, cobre, 58x30x16 cm
2 - Sopro #2, 2022. Encáustica e tinta de óleo sobre linho, 220x300 cm